14 maio 2015

mãe-mártir

Ser portuguesa é o mesmo que ser mãe de um toxicodependente. Ser portuguesa é ter um filho enfermo, pútrido, decadente. Um filho que se estende a milhares de rostos, todos eles máquinas de ruína e destruição. Ser portuguesa é ser mãe-mártir. É ter deveres, encargos, obrigações. E poucos, nenhuns, direitos – que direitos poderá uma mãe reivindicar na relação com o seu filho?
 
Afinal, ser portuguesa é ter não um, mas 563.500 filhos, todos eles enfermos, pútridos, decadentes, ruinosos, destruidores. Ser portuguesa é ter uma casa cheia de gente parida, alimentada, educada, amparada. Gente ingrata, mal-agradecida, exigente. É, ainda assim, continuar a sustentá-la. É continuar a contribuir, em prol da moral ou do afecto, para o propagar de uma nódoa que se estende e contagia.
 
Ser portuguesa é fazer um investimento a fundo perdido. É nascer já com dívidas. É ter um bando de rebeldes sem causa, vazios de ideais, acéfalos, parasitas, a sugar-lhe a mama e os ossos. Ser portuguesa é ter como único fim morrer raquítica, enfezada, mirrada.
 
Ser portuguesa fez-me mãe de 563.500 filhos (da puta, suponho eu). Tenho 563.500 filhos, funcionários públicos, que me deveriam prestar contas e servir, mas que me roubam e ultrajam. Tenho 563.500 filhos que me ameaçam, me maltratam, me burlam. Tenho 563.500 filhos incompetentes, incapazes, imbecis. Tenho 563.500 filhos que só me dão desgostos. Tenho 553.500 filhos e todos eles me envergonham.
 
Os que me deveriam dar alguma segurança social usurpam-me o chão. Os que me deveriam ajudar a ter equilíbrio financeiro esvaziam-me os bolsos. Os que me deveriam tratar da saúde arrancam-me o pêlo. Os que me deveriam fazer justiça ignoram-me. Os que me deveriam proteger intimidam-me. E sempre que peço justificações, todos me dizem: não fui eu! Como se fosse apenas mais uma tablete a desaparecer da gaveta da cozinha.
 
Ser portuguesa é ter 563.500 filhos toxicodependentes e ser vítima constante de violência doméstica. Ser portuguesa deveria dar direito a viver em casas-abrigo. Ser portuguesa é, todos os dias, desejar ser estéril.
 
(Ser portuguesa é ainda ter, pela primeira vez, um texto repleto de erros e não saber sequer como o corrigir).

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