03 março 2010

Pele

Vejo-a excomungar a pele. Arrancar partículas de ser. Esmagar entre os dedos a flacidez da carne. Vejo-a contorcer o corpo como se dele se pudessem esvair as tormentas que se açoitam lá dentro, angustiadas.
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Vejo-a lançar as unhas ao rosto, em gestos de ressaca esquizofrénica. Vejo-a sová-lo. Coagi-lo. Obrigá-lo a recuperar a coragem arrasada. Impor-lhe objectividade. Vejo-a tentar repor o orgulho, outrora içado aos céus com a leviandade dos pés agora perdidos.
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Vejo-a largar-se abandonada. Olhos húmidos, revoltos, agonizantes, moribundos. Degolados num sal adocicado sem torneira de segurança. Vejo-lhe a raiva e a repulsa, intermitentes com o desamparo e a miséria.
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Aconchego-a nuns braços feios, frágeis e imundos, sabendo que hoje são eles o seu único colo.

3 comentários:

Particle disse...

Brincado com a cronologia do teu blogue:
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O tempo são tempestades de mentiras, com contornos de sonhos, de buscas pela (i)maturidade, pela sensatez da cegueira e da sorte.

As sentenças de crescer no regresso àquele aroma de Natal, nas estações que, de regresso, descobri.

À distância, um pormenor (puzzles de distúrbios).
Os "flashes" dificultam os vestígios da sabedoria que, num Domingo, e te trouxeram felicidade.

Uma banalidade, talvez, mas aquelas asas plagiadas, endurecidas pela chuva do fim-de-semana,nem as flechas impediram-te atingir o limiar das distâncias.


A ti, o mesmo de sempre!

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Deixei umas partes e não repeti nenhuma.
Foi feito um pouco à pressa, mas aqui fica.

LiSa disse...

Obrigado.
Beijo.

Lígia Moreira disse...

Adorei mais uma vez, mas outro texto dos quantos tu escreves que transmitem signficados que nem eu propria sei decifrar.

Fica bem!
Lilly//*