11 janeiro 2013

tempo

O tempo tem uma dimensão diferente sempre que nos apaixonamos. É doloroso e faminto. Bicho sedento de carne. Verme ávido de sofrimento. Infiltra a sua indiferença debaixo da pele e corrói-nos os poros um a um. É feroz e voraz. Cáustico. Ditador impune e desdenhoso.

O tempo tem vida própria sempre que nos apaixonamos. É dono de si, súbdito insubordinado. É rebelde e marginal. Comanda os seus próprios passos, altivo e imparcial. Mascara-se. Disfarça-se. Esconde-se. Desaparece por entre as folgas do ar. E regressa, ainda mais poderoso e infame.

É mercenário e carrasco. Escorraça certezas e enclausura o desejo. Afugenta os devaneios e enxota o equilíbrio. Encurrala a loucura. Aprisiona a brandura dos sonhos. Saqueia-lhes a ingenuidade e a pureza, fervilhando angústias. Serve de fôlego à agonia. De impulso ao sufoco. De trampolim à insanidade.

O tempo é maquiavélico quando nos apaixonamos. É diabólico, cruel, bárbaro. É como a guerra e a cólera e o medo. Temível. Destruidor. Desprezível. Sucumbe à preguiça mas nunca fecha os dois olhos. Prega-se ao chão e faz-se de morto, jogador adúltero. Mas acorda, venenoso, só para lembrar que é ele quem nos algema.

O tempo é um louco indomável. É vagabundo e boémio. Solitário e infiel. É instável, inconstante e volúvel. Faz o que quer e arrasta-nos ao abismo. Sufoca e estrangula. Fere por dentro e arranha por fora. Carcome devagar de um lado e do outro.

É doentio e vingativo. Se sobrevivermos à batalha ele ri-se, soberbo e desprezível. E depois foge sem rédeas. E desfaz-se, frenético, esquizofrénico e imparável. Criatura demente!

Sem comentários: