08 novembro 2011

ansiedade

Murmuro os passos no silêncio gélido das calçadas. Sopro o vento directamente nos olhos. E afasto o céu com os sonhos que sobram na ponta dos dedos.

Trilho uma viagem dupla e desfragmentada à medida que o chão me ultrapassa sem pressas a sola dos pés. Há o cenário a deixar para trás, anónimo, um espectro sem corpo e as gavetas da memória, infiéis, a sussurrar-me, ensurdecedoras, aos ouvidos.

Lembra-te!

Há uma despreocupação física que rouba espaço à alma. As malhas do destino a empurrarem-me o fado em frente sem perguntarem sequer se quero ficar.

Não te lembres!

Trago o vazio como pano de fundo e uma teia gasta de lugares-comuns como adorno. Trago a chuva embrulhada no forro dos bolsos e as vontades encolhidas na palma das mãos. Trago um grito sem fôlego entalado na garganta e o sabor amargo do sal a corroer-me os restos da carne minguada. Trago o olhar a recuperar vagarosamente a visão e o esqueleto a reconquistar em batalhas a verticalidade.

Trago um punhado de premissas que a racionalidade tornará norma e a certeza de que o tempo jamais se cingirá ao suceder metódico das horas.

Hoje dou movimento aos ossos para impedir que petrifiquem. Sei que, cá por dentro, entre a barreira protectora das costelas, há um músculo vivo e ansioso que, em dia algum, deixarei cair em atrofio.

2 comentários:

Luis disse...

Finalmente voltas a publicar algo para eu ler

Francisco disse...

Belissima a sua descricao para algo que hoje em dia decerto nos faz morrer aos poucos...
a ansiedade

Muito Bom

FRANCISCO