Tenho-o há tanto tempo que muitas vezes me esqueci da sua existência. Lembro-me que me foi oferecido algures quando ainda tinha 14 anos. 14 anos apenas. Há quanto tempo tive eu 14 anos? Parece-me uma eternidade, da qual tenho tantas memórias.
Foi-me oferecido pelo meu pai, num dia que nada tinha de especial mas que, à semelhança de todos os outros, tinha a peculiaridade de ser único e irrepetível.
Era um CD duplo. Glen Miller. O nome nada me dizia. A imagem de um senhor franzino de óculos redondos em nada me era familiar. E a orquestra que se apresentava como cenário fugia em muito ao leque dos meus interesses.
Aos 14 anos, tal como hoje, a música era uma espécie de necessidade crónica, tão poderosa quanto um vendaval no deserto, tão mágica quando a liberdade, tão aconchegante quanto os serões entre amigos e família.
Aos 14 anos não fugia à monomusicalidade do rock e do punk, ideologias que eu desconhecia na sua essência, mas que tinham sonoridades demasiado próximas das minhas buscas.
Não ouvi Glen Miller naquele dia. Nem nos que se lhe seguiram. Não ouvi Glen Miller naquele ano. Nem nos que se lhe seguiram. Não cheguei a ouvir Glen Miller naquela década. Nem sequer naquele século. Ou naquele milénio.
Mas aquele CD duplo, com letras gravadas a dourado que contrastavam com o preto e branco da capa, caminhou na bagagem de todas as minhas mudanças de casa, de cidade, de rumo e de vida. Porque sempre soube que, um dia, haveria um momento certo para o fazer ecoar numa sala. Há dias atrás soube-o, finalmente.
Há dias senti-me mal. Talvez por tantas vezes me gabar de maleita frívola alguma conseguir alcançar-me o corpo. Há dias senti-me mal, numa madrugada longa, de trabalho tardio e acumulado. Há dias álbum nenhum, de género musical algum, me deu a paz que precisava para escrever textos e textos obrigatórios. Há dias foi Glen Miller quem me serviu de consolo, entusiasmo e inspiração. E, desde esse dia, que continua a sê-lo.
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