Falta-me a força na ponta da caneta.
Falta-me agilidade nos dedos. Falta-me motivo nas letras. Faltam-me naufrágios.
Turbulência e distúrbios. Falta-me o ruído. O risco. O desconcerto. O desencanto. O
desalento. O desconforto.
Falta-me a falta de Norte. A ausência
de fronteiras. O mar agitado. O desassossego. Faltam-me descolagens sem cinto.
Travagens bruscas. Atracagens atribuladas. Falta-me a estrada e as esquinas.
Sobra-me o ócio.
Faltam-me náuseas e nódoas
negras. Faltam-me dores e lamentos. Faltam-me problemas diferentes para as mesmas soluções. Falta-me a falta que me fazia o que está
longe. Falta-me o ar.
Falta-me vontade quando me sobra tempo.
Sobra-me cansaço quando me falta inquietação. Foge-me o desconsolo. Assenta-me
a letargia. E eu mirro. Afundo-me no assento cavado deste sofá, já moldado à
minha figura. Copio e colo. Copio e colo. Copio e colo.
Assisto à passividade mórbida do
curvar metódico dos ponteiros. Acompanho a lentidão. Encosto-me. Encolho-me. Deixo-me
talhar. Sou filtrada. E o que se separa esvai-se no fumo corrupto de mais um
cigarro. Desaparece.
Falta-me a falta dos outros
algemada à minha própria ausência. Falta-me a fome. Falta-me a sede. Falta-me a
míngua. Falta-me a saudade. Falta-me o medo.
O mundo cresceu. Não me cabe nos
braços. Falta-me lembrar-me que o quero perseguir. Falto em mim.
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