Espero Abril o ano inteiro. E depois vejo-o passar,
deixando-me a culpa nos braços. Carrego-a junto ao peito como a um bebé choroso
que precisa de berço. Embrulho-a numa manta de arrependimentos, tecida em
paciência mórbida no andar monocórdico dos dias. Abril passa e eu cá fico, com
o mesmo acenar vazio e desengonçado, lambendo um gosto amargo a saudade.
Espero Abril o ano inteiro com os olhos carregados de
esperanças e as mãos entorpecidas no cansaço dos bolsos. Fosse o fado justo e
ter-me-ia lançado ao mundo mais cedo. Não me trocasse a cronologia as voltas e teria
talvez tido alma a unir os ossos. Erros crassos que me ditam a sina.
Vejo Abril passar como uma corrente de ar a atravessar o
frio dos calabouços onde guardo a minha liberdade. Ataques de pânico a
aprisionar-me dentro da minha própria mente. E se os fantasmas me pousam nos
olhos encerro-me ainda mais em angústias. Não avanço nem recuo, neste encosto
morno a que me acomodei.
Vejo Abril passar e agarro-me com força à solidão que me
afasta do medo e do abismo. Só ela me liberta e consola, entre os muros que vou
erguendo contra o exterior. Vejo Abril passar deste mundo almofadado onde o teu
abraço me esconde, acaricia e protege.
Abril és tu, mãe, todos os dias, a amparares-me as quedas.
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