Desenharam um perímetro quadrado
à volta do mundo. Ergueram-lhe em cima quatro andares. Lacaram as janelas e
cerraram as portas. Alçaram barreiras e pontos de controlo. Vestiram sentinelas
à entrada. Atribuíram a cada elemento um código e aniquilaram-lhe a
individualidade. Desinfectaram-lhes o cérebro com lixívia e rasparam-lhes, a
espátula, os restos tanto da alma como da memória. Depois adornaram de silêncio
os corredores. Foi só esperar!
Fecharam o mundo à passagem do
universo e eu não me apercebi. Criaram um ecossistema e baniram-no da
influência das estações do ano. Forjaram a dinâmica imparável da vida. Conceberam
um protótipo e dedicaram-se à reprodução sistemática de uma única espécie.
Inventaram um dialecto e estabeleceram leis irrevogáveis. Fizeram propagar um
sistema hierárquico assente na perpetuidade. As raízes cresceram. E depois foi
só esperar.
Redesenharam o conceito de
sociedade, de onde deportaram de imediato o livre arbítrio. O bilhete, que era
só de ida, tinha selado a azul o espaço branco destinado à democracia. Não
havia também vaga para a justiça ou a igualdade. O edifício eleva-se, contudo,
no centro da metrópole como o presídio mais imponente dos tempos modernos. Foi
só esperar!
Os bichos desenvolvem-se, confinados
à rijeza sórdida das normas. Adaptam-se. E, quando se multiplicam, são mais dos
mesmos. Exemplares-padrão, imaculados por fora, pútridos por dentro. São
registos sonoros, sem alma ou memória, que repetem a ladainha sem balbuciar.
São víboras que se esqueceram que a função do veneno era proteger e não atacar.
Incapazes de vencê-los, juntaram-se a eles. Foi só esperar!
Cerraram o mundo às portas do
universo e eu não me apercebi. Às vezes tenho medo que seja apenas uma questão
de tempo.